segunda-feira, 27 de julho de 2009

Meu inferno e contos obscuros: O início

meu inferno1

Faço o sinal da cruz ao sair de casa

Lembro:

Minha mãe, escudo que me protege

Meu pai, a espada que me rege

Eu, um brasão que criou asas

Caminho, caminho, da luz ao inferno...

“Venham!” Grito aos demônios decadentes.

Caminho, de repente ando num chão, escada rolante amarela,

Que me leva para o Satânico ser vermelho ardente.

“Te peguei!” Sentado em seu trono, diz o ser maligno, com hálito mórbido.

Arregalada, responde minha alma que sonhava com um bom eterno infinito:

“Pegaste? Não criatura trivial das trevas, só vim cobrar a terra que me pertence,

quero vendê-la para aqueles que enganam ao Outro poderoso e seus serventes!”.

O tinhoso me oferece e acende um cigarro cheiro cravo envelhecido.

“Então o pequeno quer negociar! Quem disse que aqui é seu lugar?”. (mãos no meu ombro)

Aceito o cigarro! Acendo encostando-o no satânico ombro. “Agradecido!”. (respondo)

“Diz que aqui não é o meu lugar? Então qual é o meu lar?”. Balbucie ao anjo decaído.

“Ouça meu rapaz! Não tens lar ainda ao céu ou inferno, vive no contraditório!”

Cuspo a fumaça na face avermelhada, macabra e refaço a proposta:

“Devo admitir, já trabalho para o Outro! Aquele que me fez estar no purgatório,

mas procuro fazer justiça com o bem e o mal. Deixa-me comprar almas decaídas?”

O Capeta, de olhar desconfiado, pensa, pensa e pergunta com a boca esfumaçada:

“Não seja ingênuo, rapaz! Sempre trabalhei sozinho. O que ganharia com isso?”

Jogo o cigarro fora! Tiro de meu bolso direito, metade de minha alma. Digo: “Isso...

Cinqüenta por cento de minha alma de graça. E metade de meu tempo ao seu serviço.”

Rindo, o tinhoso diz: “O que queres realmente, tomar meu posto, rapaz pretensioso?!”

“Não senhor do mal, só quero ser justo! Juro, não procuro ser vaidoso!”

Analisando a mercadoria agora em mãos peçonhentas diz: “Vejo que esta é sua pior parte!

O que mais pode me oferecer, além desta parte de alma negra, diga pobre teimoso!”

Eu, cansado da conversa fiada, faço minha última parte da oferta, arrisco:

“Ofereço-te um lugar onde poderá passar suas férias malditas a se divertir Tinhoso...

Troca de lugar comigo, vá trabalhar pra ganhar o pão, Cramunhão maldito,

Posso apostar que lá terás um inferno melhor que o teu. Encontrarás trevas e céus todos os dias!

Coçando o chifre, o Diabo rei tem brilho nos olhos e estende-me a mão logo em seguida...

Diz: “Feito, pequena alma, fica no meu lugar durante alguns dias, estou a precisar de férias!

Assim o Capeta endiabrado subiu a escada rolante amarela e partiu para as malditas férias.

Eu, todavia, fiquei naquele reino e logo coloquei disciplina no inferno, fiz auditoria.

Brevemente descobri almas honestas perambulando no inferno de Dante...

Comecei um cadastro das almas ali, fichei quase todos, bons, maus e errantes.

Foram meses a fio na “infernosa” labuta, mas senti-me bem na ajuda aos dementes!

Quando depois de quase um ano no júbilo inferno, o Diabo volta à sua toca...

Diferente, bem aparentado, sem chifres, não era mais o Diabo. Pergunto invocado:

“Quem és figura angelical? O que queres na zona do mal? Responda, vamos rápido!”.

“Sou eu rapaz, o velho Diabo, meu antigo nome Lúcifer, agora não mais. Fui perdoado!

Em falar no Diabo... o que fez com o inferno rapaz, está tudo mudado... (olhando para os lados)

Não sei bem, parece que aqui está mais organizado, as lavas infernais estão brilhando,

Os malditos estão mais calmos, gritando menos, a sala de estar menos abafada...

Parece um pouco mais vazio, menos quente, mais leve, o que fez, conta!”.

Eu, desgarrado daquela nova imagem de Satã, não contei nada, repeti: “Perdoado?”.

E ele responde: “Sim, minha estadia em seu lugar me deu a rendição, já foi consumado...

O poderoso me perdoou, voltei a ser anjo, fui humildemente de volta aceito!

Vim apenas lhe dizer que este não mais é meu lar, agora sou bom e respeitado.”

Estático penso: “o que aconteceu com o mundo neste meio tempo? Diabo desculpado?”

Depois de o meu pensar, falo ao ex-Diabo: “Bem meu caro mais novo bondoso...

Não sei o que dizer, mas preciso voltar pra minha terra, ainda mais, logo cai o meu salário.”

Pois o antigo Cramunhão sorrindo diz: “Impossível! Tu foste sucumbido de cuidar de tudo aqui...

E, além do mais, está fazendo um ótimo trabalho, certeza, tem ainda muito a fazer, não pode sair,

entenda, sua missão pode ser fazer do inferno um lugar melhor, ou pior, agora tu és o dono!”

Ele me entrega um papel que estava em mãos, desde que chegou, escrito: “Novo proprietário”.

“Não!” Gritei. “Estudei, recebi educação, valores, tudo na minha vida, não foi pra virar demônio!”

Então vi o velho Diabo ao mesmo que ria por dentro, no fundo tinha dó de mim e de meu destino.

“Sei que é difícil filho, mas o documento é legítimo, foi feito pelo Outro poderoso, é ele quem manda.

Não há escolha, apenas aceite e se adapte ao seu novo lar, agora seu mais novo inferno.”

Vertigem, náuseas, senti-me traído. Estaria o Criador, tentando me recriar como Diabo?

O antigo Diabo, agora chamado Luciano me devolveu a metade ruim da minha alma...

a readicionei em meu ventre espiritual, todo o mal e vejo o ex-Diabo ir embora para o paraíso,

feliz e perdoado; eu agora sou o Diabo, não acredito. Como me portar? Como ser um maldito?

Eram perguntas respondidas pelo silêncio, quebrado pelos gritos infernais no meu novo lar.

Rasgo aquele documento, num ato de besta-fera, coloco fogo, fumaça negra comprime o ar,

Penso de novo, e de novo e de novo... “Não é possível Deus agora é um Demônio...!”

Repito aquele pensamento uma centena de vezes, milhares, num só instante, estava com nojo.

Enojado daquele jogo de Deus, Diabo, Demônio, bem, mal, certo, errado e todos os rótulos.

Tive idéias anárquicas! Mas foi só por um instante. Me voltei, fui e sentei em meu novo trono.

Lá permaneci. Meditei durante algum tempo no inferno. Não se conta os dias, meses ou anos.

Pensei com mais calma, mas nada concluía. Só Sentia a dor da traição, mas de quem realmente?

Do mundo? Do poderoso criador? De mim mesmo por ter ido ao inferno como um demente?

Só queria ser justo com o equilíbrio do universo, não importa mais! Estou preso perdidamente.

Aceito afinal! Só guardo a rebeldia em um de meus olhos, quando demoninhos chacais batem.

Treme a forte porta de material desconhecido na minha sala de estar do castelo infernal.

Eram dois! Um: “Licença! A verdade já tomou o inferno todo, és a nova forma do mal,

Tu, senhor que era o substituto tornou-se insubstituível, és o mais novo dominador infernal.

O outro completa: Trouxemos o novo traje a ti, nosso senhor e pedimos tua benção!

Olhei os dois infelizes e não relutei: “Estejam abençoados! Deixe-o por aí e ide!”

Peguei em mãos o meu novo traje, um sobretudo preto de mangas vermelhas, com botão...

um chapéu e uma bengala, parte superior cromada e a ponta de baixo em forma de tridente.

Vesti. Finalmente me transformei por completo no novo Diabo e caminhei para fora do castelo.

Fui em direção a infeliz multidão, lentamente com meu traje, disse: “demônios carentes...

uma nova era nasce, uma nova nação infernal. Muito por aqui irá mudar, mas continuará quente,

não preocupai-vos, todos os que merecem continuarão aqui e os injustiçados serão liberados...

expurgados de volta a terra para o renascimento.” Todos os demônios me olham silenciados.

Minha voz era alta, mas uma mulher endemoninhada chega próximo e pergunta ofegante:

“Mas o senhor não pode fazer isso... não é só o Outro quem tem este poder do “Reencarnate”?”

Respondi ainda mais alto: “Pois aí está à diferença, não quero ser mais que o Outro...

Vejam, eu serei o maldito sem horror, o mau justo, não quero ser mais poderoso...

serei exatamente o que o senhor Outro quis, serei menos e tanto quanto ele.”

Enfim os aplausos dos malditinhos, vulcões e lavas transbordam após meu discurso,

assim encerra o início de meu reinado. Voltei para dentro junto ao meu trono...

já começava a esquecer todo o meu lado humano, minha família, amigos, meu lado bom,

resolvi fazer uma última visita. Fui lá, subi a escada rolante amarela que abre o chão.

Caminho, caminho... com meu traje preto, minha bengala tridente e agora sem coração.

Neste estágio, sou o Maldito, o Diabo, o Tinhoso, o anjo caído, o Cramunhão,

Me tornei de verdade no Senhor dos demônios, dos desesperados, até quando?

De qualquer forma, sigo para a antiga casa em que habitei, para um desejo humano.

Não faço o sinal da cruz ao chegar perto de casa

Lembro:

Minha mãe escudo que me protegeu,

Meu pai a espada que me regeu,

Eu, um infeliz brasão que perdeu asas.

Mesmo assim beijo o chão da família que me acolheu.

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